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Publicado por em jan 25, 2022 em Artigos |

Crítica: Eu não sou um robô

por Rodrigo de Oliveira

Eu Não Sou um Robô é tão criativo quanto divertido, embora não esqueça de colocar o dedo na ferida na questão do isolamento social e na solidão. Dirigido por Gabriela Lamas (do ótimo e premiado Sesmaria, 2015), o curta tem roteiro assinado a seis mãos (Lamas, Felipe Yurgel e Maurilio Almeida) e com uma ajudinha de amigos, que enviaram áudios no WhatsApp para ajudar em alguns diálogos. Concebido durante a pandemia, o curta teve muitas reuniões virtuais e a gravação em si foi realizada com apenas três pessoas: a diretora e roteirista Gabriela Lamas (que vive a protagonista), o produtor e roteirista Maurilio Almeida (que interpreta a Mosca) e a diretora de fotografia Lívia Pasqual. Incrível que de um grupo tão pequeno possa ter saído um filme tão redondo.

Na trama, a protagonista falha ao tentar passar nos testes ReCAPTCHA na internet e tenta se convencer de que não é um robô. Na cozinha, ela encontra uma mosca e começa a trocar uma ideia com o inseto. Os assuntos são os mais variados – da alimentação à política, das reuniões no Zoom à morte da vizinha. Em dado momento, parece que a amizade entre os dois pode virar outra coisa. Mas se a mosca sumir, ela tende a voltar?

São muitos pontos a se destacar. Primeiro, a naturalidade com que Gabriela Lamas interpreta o verborrágico texto de sua personagem. Em dados momentos, ela parece estar criando na hora o texto, dando uma dinâmica muito crível. Depois, a Mosca. Além de ter uma fantasia ótima (máscara feita por Lamas, pagando tributo a David Cronenberg), o inseto humanoide se comunica com o som de um instrumento de corda grave. Mal comparando, imagine os adultos de Charlie Brown, mas com um twist esquisito. Em terceiro lugar, a narrativa, que consegue transformar um curta cheio de texto em algo nada pesado. Somos envolvidos rapidamente pela relação entre os dois personagens – a referência a Ghost (1990) é bárbara. O final reserva uma bela surpresa, algo que Cronenberg veria satisfeito.

Texto publicado originalmente na cobertura da Almanaque21 do Cine Esquema Novo.